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Seja na taxa do crédito para fazer um empréstimo ou tomar um financiamento no banco, até o preço de mercadorias importadas e o mercado de trabalho, a taxa Selic exerce importante influência sobre uma série de variáveis no dia a dia de todas as pessoas. “A taxa Selic representa o custo do dinheiro. Ela é um instrumento da política econômica do país usada para controlar a inflação”, afirma Clay Gonçalves. planejadora financeira CFP da plataforma SuperRico.
Para os consumidores uma Selic alta implica em um maior custo de crédito, tornado o financiamento de bens muito mais caro, diz Vicente Guimarães, CEO da empresa de análise de investimentos VG Research. Para as empresas, uma Selic em patamar elevado implica em um maior custo para o financiamento de projetos produtivos, o que tende a reduzir a expansão dos negócios, acrescenta o especialista.
Nesta quarta-feira (2), o Banco Central (BC), por meio do Comitê de Política Monetária (Copom), deve tomar uma decisão sobre a taxa. A expectativa predominante no mercado é de redução em 0,25 ponto percentual, para 13,50% ao ano. Ao longo dos últimos meses, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva fez diversas críticas à decisão do BC de não ter iniciado antes o ciclo de queda da Selic, de modo a permitir um aumento do consumo das famílias.
Entenda a seguir os principais impactos que a taxa básica de juros definida pela autoridade monetária causa para indivíduos e empresas.
Segundo Rachel de Sá, chefe de economia da Rico, um dos impactos mais claros da taxa Selic é nos juros dos financiamentos, seja para pessoas ou para empresas. “A Selic é importante na vida das pessoas porque ela vai servir de base para todos os juros da economia, como empréstimos, financiamentos e investimentos”, afirma a especialista.
Por isso, quando o BC eleva os juros, todas as taxas praticadas no mercado também sobem, embora não na mesma proporção, diz a chefe de economia da Rico, acrescentando que o contrário também é verdadeiro. Ou seja, quando o BC reduz os juros, as taxas de mercado igualmente são reduzidas.
A taxa Selic, explica Enrico Cozzolino, chefe de análise da Levante, é o instrumento que o BC tem à sua disposição para controlar a inflação, aumentando os juros quando os preços estão acima da meta estabelecida pelo CMN (Conselho Monetário Nacional) e encarecendo o crédito, e diminuindo quando os preços estão abaixo dos patamares desejáveis para estimular a economia.
A taxa Selic influencia desde as taxas de empréstimos pessoais, de financiamentos imobiliários, do cartão de crédito, do cheque especial, até os empréstimos para as empresas, entre outras, diz Clay, da SuperRico.
No entanto, como a redução dos juros ocorre de forma gradual e comedida, o impacto nos juros segue a mesma intensidade.
Um levantamento feito pela Anefac (Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade) mostra que a redução da taxa básica de juros de 13,75% para 13,50% ao ano acaba tendo um efeito muito pequeno nas operações de crédito. “Este fato ocorre uma vez que existe um deslocamento muito grande entre a taxa Selic e as taxas de juros cobradas aos consumidores que, na média da pessoa física, atingem 126,26% ao ano”, diz a Anefac.
Com a Selic em 13,50%, a taxa média de juros praticada pelo mercado à pessoa física é de 7,02% ao mês, e de 125,72% ao ano, indica estudo da Anefac. Quando a taxa básica era de 13,75%, a taxa era de 7,04% ao mês, e de 126,23% ao ano. Na hipótese menos provável de um corte de meio ponto, no qual a Selic baixaria para 13,25%, a taxa média de juros praticada pelo mercado à pessoa física é de 7,00% ao mês, e de 125,22% ao ano.
A chefe de economia da Rico acrescenta que a Selic também guarda relação com o poder de compra das pessoas. Por um lado, uma taxa de juros mais alta torna o crédito mais caro, inibindo a contratação de crédito nos bancos, mas, ao mesmo tempo, reduz a inflação e estimula o consumo. “A Selic é um remédio amargo, mas para combater um problema pior que é a inflação alta, que, se sai do controle, é muito ruim para as famílias, principalmente para a população mais pobre que não tem como proteger o seu poder de compra”, afirma a especialista.
A especialista da Rico diz ainda que a Selic também acaba afetando o câmbio. Isso porque, quando a taxa está mais alta, ela atrai mais investimentos para o país e tende a causar uma depreciação do dólar, o que acaba sendo positivo para o controle da inflação ao reduzir o preço de produtos importados.
Além disso, a taxa básica de juros também é importante para balizar a expectativa das pessoas sobre o futuro da economia. Se as pessoas esperam que uma Selic em um patamar baixo vai abrir espaço para a inflação subir, automaticamente essa expectativa passa a ser embutida nos preços de serviços e mercadorias mesmo antes que os preços de um modo geral subam de fato, diz Cozzolino, da Levante.
A chefe de economia da Rico afirma que, à medida que uma Selic alta atua para desaquecer o ritmo da atividade econômica de modo a trazer a inflação para baixo, ela acaba afetando também o mercado de trabalho.
Quanto menor o ritmo de crescimento da economia, menos as empresas vão vender em produtos e serviços, e menor será a necessidade de mão de obra.
“Só é possível contratar novos colaboradores ou não demitir os atuais se a empresa estiver produzindo o suficiente para aumentar a sua taxa de crescimento. Com o crédito mais caro, a produção diminui e o desemprego aumenta, bem como não há geração de novos empregos”, diz a planejadora financeira da SuperRico.
Por outro lado, quando a Selic está em patamares mais baixos, a tendência é de um aquecimento da atividade econômica, com as empresas contratando mais funcionários para fazer frente à demanda por suas mercadorias.
“Existe um ponto de equilíbrio entre o quanto o mercado de trabalho está aquecido e a pressão sobre os salários e, consequentemente, a inflação”, diz Rachel. Quanto menor o desemprego, mais difícil é para a empresa encontrar funcionários e maior precisa ser o salário oferecido para atrair pessoas qualificadas para as vagas. E, quanto maior o salário, maior o poder de compra, com reflexo para a inflação.
“O mercado de trabalho aquecido e os salários e a inflação em alta pressionam o setor de serviços, que é o mais difícil de controlar com a Selic. É desde a manicure até o pequeno restaurante que, com receio de que os preços vão continuar subindo, já vão antecipando o ajuste nos serviços cobrados”, diz Rachel.
O chefe de análise da Levante afirma que a Selic também impacta diretamente o rendimento dos investimentos no mercado financeiro.
Como serve de baliza para todas as outras aplicações financeiras de renda fixa, uma taxa básica de juros mais alta torna mais atraente a aplicação em títulos públicos emitidos pelo governo para se financiar ou em títulos privados de grandes empresas.
Além da própria Selic, os juros dessas aplicações financeiras também levam em conta os juros futuros, que são as taxas esperadas pelos investidores no futuro, afirma Cozzolino. Ele acrescenta que, quando a taxa entra em trajetória de queda, o racional se inverte, e o rendimento das aplicações também vai diminuir.
Segundo levantamento realizado a pedido da reportagem por Andrew Storfer, diretor de economia da Anefac, com a nova taxa de juros de 13,50%, um investimento de R$ 1.000 no título público Tesouro Selic resulta em um rendimento líquido de R$ 111,92 em um intervalo de 12 meses, com a incidência de juros de 13,57%, já descontado o IR (Imposto de Renda) de 17,5%.
Até meados de junho, quando da última reunião do Copom (Comitê de Política Monetária), em que a Selic ainda estava em 13,75%, a mesma aplicação rendia R$ 114 em um ano. Na hipótese menos provável de um corte de meio ponto, de acordo com o levantamento de Storfer, um investimento de R$ 1.000 no título público Tesouro Selic resulta em um rendimento líquido de R$ 109,86 em um intervalo de 12 meses, com a incidência de juros de 13,32%, já descontado o IR (Imposto de Renda) de 17,5%. Até meados de junho, quando da última reunião do Copom (Comitê de Política Monetária), em que a Selic ainda estava em 13,75%, a mesma aplicação rendia R$ 114 em um ano.
A chefe de economia da Rico afirma ainda que a Selic tem uma relação inversa com as ações na Bolsa de Valores. Quando os juros sobem, a tendência é que as ações, na média, recuem. Tanto porque o interesse do investidor se volta mais para a renda fixa, com redução da participação em renda variável, como porque o custo do financiamento para as empresas aumenta, com impacto negativo na lucratividade da operação e, consequentemente, para o preço da ação. “Se uma empresa está com uma dívida grande, quanto maior a taxa de juros, mais difícil será sua situação financeira.”
Guimarães, da VG Research, afirma que 1 ponto percentual a mais da Selic causa um aumento de dezenas ou até de centenas de milhões a serem pagos em juros por ano por uma empresa. “Obviamente, isso impacta diretamente a lucratividade das empresas.”